O Advogado do Diabo, Matrix e a Manipulação do Nosso Tempo


O Advogado do Diabo, Matrix e a Manipulação do Nosso Tempo
Assistindo ao filme O Advogado do Diabo, de 1997, percebi como uma obra considerada antiga pode ser incrivelmente atual em sua essência. Al Pacino interpreta John Milton, um personagem debochado, irônico e sedutor, que representa a manipulação em sua forma mais sofisticada. Ao lado dele, Keanu Reeves vive Kevin Lomax, um jovem advogado ambicioso que acredita estar fazendo suas próprias escolhas, quando na verdade tudo já estava conduzido. Essa é a primeira lição: o livre-arbítrio é muitas vezes apenas uma ilusão.

Há uma cena emblemática que me marcou profundamente. Enquanto um homem é assassinado no parque por pessoas em situação de rua, Milton conversa com Kevin em segundo plano, quase como se estivesse narrando o sentido oculto daquela violência. O crime acontece diante dos olhos, mas o discurso traduz aquilo em ideologia: não existe acaso, existe manipulação, existe poder, existe controle. Essa cena mostra de forma nua e crua como a narrativa é tão ou mais importante que o fato em si.

E aqui está a ponte com a nossa realidade. Se antes o “diabo” era um personagem de ficção, hoje ele se manifesta de forma muito mais concreta nos algoritmos, nas big techs e nas fake news. As máquinas já não apenas nos oferecem informações, mas antecipam nossos desejos, nossas crenças e até nossos ódios. Os algoritmos conseguem prever o que vamos pensar antes mesmo de pensarmos. Essa manipulação silenciosa, que parece inofensiva, molda consciências inteiras.

Quando trago isso para o campo político, a reflexão se torna dolorosa. Resistimos, mas a extrema-direita sempre parece estar dois passos à frente. Eles jogam com uma estratégia unificada, enquanto nós, na esquerda, seguimos fragmentados em grupinhos e subgrupinhos, divididos por ressentimentos e vaidades. Dizemos que temos maturidade política, mas muitas vezes guardamos mágoas por escolhas partidárias ou resultados eleitorais. O companheirismo que antes era de sangue, hoje muitas vezes virou apenas um abraço protocolar em atos públicos.

Na trincheira de luta, trago minhas armas de conhecimento e encontro soldados com sangue de luta, mas sem preparo para enfrentar a guerra digital. Enquanto isso, lideranças se valem das nossas causas para se perpetuarem no poder. É um cenário chocante: coragem sem técnica, luta sem estratégia, paixão sem unidade.

Assim como Milton manipula os personagens no filme pela vaidade e pelo narcisismo, também nós caímos nessas armadilhas. A esquerda se perde em disputas internas, e o inimigo maior, o sistema, avança. Continuamos sem uma Constituição Digital, desarmados diante da guerra que se trava no campo virtual. Estamos vivendo, de certa forma, dentro de uma Matrix, onde realidade e ficção se confundem, mas é lá, no campo digital, que se decide o futuro do campo físico.

O Advogado do Diabo, apesar de antigo, nos mostra com clareza o que significa manipulação e como ela opera. Hoje a forma mudou, mas a essência continua a mesma. O filme expõe a vaidade humana como porta de entrada para o controle. E nós, na vida real, seguimos sendo manipulados enquanto fingimos que escolhemos.

Ao final, fico com uma frase que me acompanha como gatilho mental: estou com um pé dentro e outro fora da cova. Não por desistência, mas porque o cansaço da luta é real. Já dei minha contribuição, já fiz o que tinha que fazer, e agora penso que caberá às gerações futuras encontrar novas forças. Mas ainda assim, mesmo cansado, não posso deixar de registrar: sem consciência coletiva, sem companheirismo verdadeiro, sem unidade de classe, não há vitória possível.

Talvez seja esse o grande recado que um filme de 1997 ainda nos dá em 2025: quem controla a narrativa controla o mundo. Quem ri do caos, manipula. Quem se divide, perde.

Fernando Kabral
Olinda, 16 de agosto de 2025 – 20h00

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